Alagoas tem 617 denúncias de violência contra LGBT e 10 mortes em 2022
Segundo o GGAL, apenas quatro dos casos de assassinatos contra este público foram elucidados pela polícia no estado
Só este ano, de acordo com o Grupo Gay de Alagoas (GGAL), o estado já registrou 10 mortes violentas de pessoas LGBTQIA+, a sigla que representa lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queers, intersexos, assexuais e demais orientações e identidades. Destes casos, apenas quatro foram elucidados, afirma o presidente da entidade Nildo Correia.
Ele aponta que seis desses assassinatos foram registrados no interior de Alagoas.
A última morte que entrou na estatística do GGAL foi registrada na madrugada do sábado (22) quando um homem invadiu a residência e agrediu o namorado de seu ex com golpes de foice, fugindo em seguida. Era por volta de meia-noite quando a agressão foi registrada e militares do 5º Batalhão de Polícia Militar (BPM) foram acionados para a ocorrência de homicídio.
A vítima era um homem trans morador do bairro de Antares e foi socorrida para o Hospital Geral do Estado (HGE) por terceiros. Ele acabou não resistindo aos ferimentos e morreu.
Para o presidente do GGAL, o número de mortes violentas está relacionado ao preconceito que ficou ainda maior em 2018 com as falas do atual presidente Jair Messias Bolsonaro. “A certeza da impunidade e essa libertinagem fantasiada de defensora da boa moral fortaleceu e muito a LGBTfobia no país”.
Correia diz que ainda faltam políticas públicas concretas. “É preciso investir em campanhas de conscientização, profissionalização, empregabilidade e fortalecimento da maior ferramenta de transformação social LGBT do estado, como o Centro de Acolhimento Ezequias Rocha Rego (CAERR) - ferramenta essa que hoje a duras penas trabalha tudo isso, mesmo com todas as dificuldades”.
AGRESSÕES
Em relação às agressões, Nildo diz que mais de 75% são realizadas por pessoas próximas às vítimas. “A intolerância contra LGBTQIA+ começa muitas vezes em casa e envolve agressores conhecidos das vítimas, como familiares, vizinhos e companheiros. São casos de humilhação, ameaça, hostilização, discriminação e até agressão física e, em muitos casos, a vítima é expulsa de casa”, comenta.
Este ano, de acordo com o GGAL, já são 617 denúncias de agressões físicas e morais. “A última que recebemos foi na segunda-feira (24) de um homem trans que foi agredido por um dono de bar aqui na capital. Mas são dados com subnotificação. O preconceito, o medo da repressão e a vergonha de denunciar, ainda fortalecem e muito a impunidade”, pontua Correia.
Mulheres trans são impedidas de usar banheiro feminino
Alguns casos chamam à atenção e ganharam repercussão em Alagoas. Um deles é o de Lanna Hellen. No dia 3 de janeiro de 2020, ela foi impedida por um segurança de usar o banheiro feminino em um shopping da parte alta de Maceió. O segurança bateu a porta do banheiro e pediu para que Lanna se retirasse, pois uma cliente se sentiu incomodada.
“O acontecimento do shopping, querer usar o banheiro e ser impedida por ser uma mulher trans, foi a primeira vez que me aconteceu. Como eu residia em São Paulo, existe preconceito, mas não nessa gravidade, não como ocorreu no dia desse fato”, explicou Lanna. “Então eu fiquei muito chocada com o acontecido, fiquei surpresa por não poder usar o banheiro feminino, onde o segurança tinha alegado que uma cliente comunicou que se sentiria constrangida se encontrasse um homem no banheiro. Essa cliente nunca foi achada até hoje”, concluiu.
Outro caso aconteceu recentemente em Arapiraca. No dia 28 de agosto deste ano, a influencer trans Rebecca Rodrigues denunciou ter sido vítima de transfobia durante o evento Miss e Mister Alagoas 2022, na cidade. De acordo com o relato da influencer em suas redes sociais, ela estava usando o banheiro feminino do Espaço Renê quando foi expulsa duas vezes pelos seguranças do local. “Nunca imaginei ser tão humilhada e diminuída em um local que dissemina a diversidade e a pluralidade, mas que na verdade entrega ódio e preconceito”.
DISQUE 100
Alagoas registrou 15 denúncias de violência contra população LGBTQIA+ e 74 violações de direitos desta população no primeiro semestre deste ano, por meio do Disque 100, segundo dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH). O número de denúncias apresentou um aumento de mais 100%, se comparado com o mesmo período do ano anterior, em que foram contabilizadas sete denúncias.
Em todo o Brasil, houve um aumento de 7,36% nas denúncias de violência contra população LGBTQIA+. Conforme os dados da ONDH, foram registradas 729 denúncias neste ano, entre os meses de janeiro e junho, e 679 denúncias no mesmo período de 2021.
De acordo com a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, o número de denúncias representa a quantidade de relatos de violação de direitos humanos envolvendo uma vítima e um suspeito, sendo que uma denúncia pode conter uma ou mais violações de direitos humanos. Já as violações configuram qualquer fato que atente ou viole os direitos humanos de uma vítima como, por exemplo, maus tratos e exploração sexual.
Levantamento aponta que Nordeste é a região mais insegura
Um levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) revelou que, de janeiro a junho de 2022, o Brasil já registrou 135 mortes de população LGBTQIA+. De acordo com a pesquisa, que é baseada em coletas de notícias de jornais e portais digitais, houve uma queda de 20% em relação ao mesmo período de 2021, quando foram registradas 168 mortes.
Neste primeiro semestre, de acordo com a pesquisa, foram mortos na maioria gays, travestis, transexuais e mulheres trans. Entre as vítimas, 33,3% são pardas; 22,9%, brancas; 9,6%, negras; e 34,2% não tiveram a cor da pele identificada.
O levantamento do GGB aponta que a Região Nordeste teve o maior número de casos, foram 52 mortes, seguida pelo Sudeste com 38, o Norte com 23, e o Centro-Oeste com 17. Já a Região Sul teve cinco mortes.
Em todo o ano de 2021, o país registrou 300 mortes de LGBTQIA+ segundo aponta o Observatório de Mortes Violentas do GGB. Ou seja, 8% a mais que em 2020, quando foram registrados 276 homicídios (92%) e 24 suicídios (8%). O Brasil continua sendo o país onde mais LGBTQIA+ são assassinados: o equivalente a uma morte a cada 29 horas.
Esses dados se baseiam em notícias publicadas nos meios de comunicação, sendo coletados e analisados pelo Grupo Gay da Bahia, que há 40 anos divulga essas tristes estatísticas, cobrando do governo políticas públicas que erradiquem essa mortandade, que vai muito além dos números, pois representa apenas a ponta de um iceberg de ódio e sangue.
RANKING DE 2021
São Paulo, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Ceará, Pará, Pernambuco, Mato Grosso e Alagoas. Estes são os 10 estados com maior índice de mortes violentas em 2021, sendo quatro deles na Região Nordeste.
Segundo o levantamento: São Paulo fica em 1º lugar no ranking com 42 casos (14%); em 2º, a Bahia com 32 registros (10,7%); em 3º, Minas Gerais com 27 (9%); em 4º, o Rio de Janeiro com 26 casos (8,7%); em 5º, o Paraná com 19 (6,33%); em 6º, o Ceará com 17 (5,7%); em 7º, o Pará com 17 (5,7%); em 8º, Pernambuco com 16 (5,33%); em 9º, o Mato Grosso com 15 (5%); e em 10º, Alagoas com 13, o que configura 4,33%.
AGRESSORES
A impunidade dos assassinos de LGBTQIA+ constitui gravíssimo problema e agravante para a repetição destes mesmos crimes: apenas 95 dos 300 criminosos foram identificados nos noticiários e demais fontes em 2021, ou seja, somente 31,67% dos casos foram elucidados no mesmo ano da ocorrência, o que representa três em cada 10 episódios de mortes violentas de LGBTQIA+, sendo tal número ainda mais desfalcado pelo fato de alguns dos agressores serem menores de idade, que recebem penas muito mais brandas.