''Cuidado com o que você pede a Deus, pois Ele pode atender à sua súplica.''
(Advertência popular)


“Os sonhos são cargas emocionais armazenadas no inconsciente, as quais projetam imagens e sons. De acordo com Freud, como sabemos que os objetos nos sonhos são derivados de cargas emocionais, podemos, através deles, chegar à raiz, ou seja, às emoções que geraram essas imagens ou sons.” Para Freud, os sonhos noturnos são gerados na busca pela realização de um desejo reprimido.

Pode soar paradoxal, entretanto, acredito que, quando alguém deflagra uma luta pela realização de um desejo há muito reprimido, desencadeia-se, simultaneamente, no âmbito da consciência do desejoso, outra luta — esta, visando à não realização daquele mesmo desejo. Nesse caso, a resistência à concretização do desejo pode configurar a manifestação de um sintoma de natureza neurótica.

Quando alguém decide lutar pela realização de um desejo, tal esforço certamente indica que há resistência à concretização desse anseio, principalmente quando sua efetivação envolve algum tipo de ilegalidade, imoralidade ou ameaça ao status quo do próprio desejoso.

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Simbolismo dos sonhos
Conforme Sigmund Freud, o pai da psicanálise, “o sonho é o espaço para realizar desejos inconscientes reprimidos”. Assim sendo, trata-se da realização de um desejo que, até então, vinha sendo recalcado, reprimido, negado. Portanto, é natural que exista resistência a qualquer tentativa de realização dessa expressão onírica.

No caso, por exemplo, de alguém (adulto) que conviva com um irresoluto Complexo de Édipo, seu relacionamento, em sonho, com a autoridade paterna e com a própria mãe poderá ocorrer de forma antagônica, mas geralmente expressa sob disfarçada forma de singela ternura maternal e regozijo filial.

Diferentemente do pesadelo, a rejeição à prática de incesto no desenrolar de um sonho se dá de forma moralmente definida pelo Superego. Ainda assim, há uma tendência a facilitar os acontecimentos, conformando-os à “amoralidade do Id”. Nessas condições, no desenrolar do evento onírico, o filho pode abraçar a mãe com amabilidade filial; contudo, sentindo profundo prazer sexual — o que Freud poderia compreender, como talvez tenha compreendido, ao afirmar que manifestações oníricas dessa natureza estão relacionadas a “um fenômeno regressivo, o qual nos devolve aos estados primitivos da infância”.

Talvez por isso mesmo, o sonhador edipiano, sob aquela excitação sexual onírica, não perceba que sua mãe, apesar de sentir aquele voluptuoso contato do filho, parece ignorar esse seu estado. Apenas sorri para a sua cria, sugerindo que, naquele momento, ela o enxerga como se ele ainda fosse um bebê.

A forma materna de se expressar — a gesticulação delicada, a suavidade ao falar e sorrir, o aconchego carinhoso — representa apenas o conteúdo manifesto do sonho. E o sonhador, certamente, poderá descrever aquele momento ocultando o fato de que esteve, o tempo todo, sob forte impulso sexual de tendência incestuosa.

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Interferir no sonho: produzir conscientemente o enredo onírico
Quando o sonhador passa a ter consciência de que, naquele exato momento, está sonhando — e que, portanto, não haverá testemunhas de seus atos —, ele pode tentar projetar cenas sexualmente mais ousadas. Tal intenção pode ser compreendida pelo fato de que o sonhador, até então, não se sentia policiado, nem mesmo assistido pelo guardião da moral e dos bons costumes, o Superego.

Também não mais ouvia os estímulos do Id pregando em favor da suposta amoralidade do ato, considerando a naturalidade do sexo como resposta a necessidades fisiológicas de um ser biológico.

Além disso, o sonhador não reconhece, naquele quadro onírico, outra força sexualmente estimulante que não seja a figura de sua própria mãe. Em vista disso, ele pode entender o comportamento da mãe como um consentimento natural às suas intenções libidinosas.

Assim, o sonhante, acreditando que seus mecanismos de defesa contra o afloramento de elementos inconscientes estejam temporariamente desativados, tenta investir sua libido (energia motora da pulsão sexual) na realização do mais perturbador dos relacionamentos sexuais: o incesto — mais precisamente, a relação sexual entre pais e filhos, o mais inflexível dos tabus referentes ao relacionamento sexual entre humanos.

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A assimilação do que venha a ser pulsão sexual fundamenta-se na distinção entre tais impulsos, oriundos da libido, e os impulsos popularmente reconhecidos como instintos sexuais.

As imagens e o desenrolar dos acontecimentos em um sonho são, certamente, fruto da nossa imaginação. E a “interpretação dos sonhos” pode ser considerada um instrumento apropriado para quem busca conhecer melhor a si mesmo.

A sexualidade humana possui ampla significação para a compreensão do nosso comportamento, tanto no âmbito da família (do nosso núcleo familiar), quanto na comunidade em que vivemos e na sociedade que, permanentemente, construímos. Trata-se de um tema mais que simplesmente polêmico: é frequentemente contaminado por vícios conceituais de ordem moral, sendo, eventualmente, um tema tabu. Abordá-lo em determinados ambientes pode infringir regras e costumes sociais, culturais ou religiosos.

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Fernando Soares Campos é psicanalista e escritor, autor de “Adeildo Nepomuceno Marques – Um carismático líder sertanejo”, em parceria com o seu irmão Sérgio Soares de Campos. Fernando também assina três outros livros de autoria solo: “Deus e o Universo Holográfico” é o mais recente, publicado pela editora SWA, Santana do Ipanema-AL.