Cultura Viva e a ameaça governamentalÂ
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O Cultura Viva não deve ser tratado como mercadoria, não se constitui para gerar produtos como aponta os instrumentais do governo.
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Publicado 14/12/2024 09:30 | Editado 13/12/2024 12:10
O Cultura Viva tomou uma dimensão latino-americana de movimento polÃtico alinhado a uma perspectiva de projeto de sociedade baseado em principios de solidariedade, igualdade, emancipação econômica e humana e de movimento focado na transversalidade da cultura. No Brasil, essa experiência, que nasce como programa de governo em 2004 e que depois se torna polÃtica de estado em 2014, representa uma das polÃticas mais ousadas e transgressoras no campo cultural, o seu surgimento impacta na relação estado e sociedade civil, descentralização de recursos públicos, autonomia organizativa e polÃtica na gestão do fomento e nas formas de controle e participação social. É a experiência brasileira que se torna chama continental para que o movimento se constitua.Â
O Cultura Viva, enquanto movimento e polÃtica pública tem suas diferenças e limites. O movimento é para o enfrentamento, construção de sonhos e a defesa de uma modelo de sociedade que se contrapõe as estruturas de exploração e opressão. O movimento Cultura Viva é coisa de comunista mesmo! Já o estado tem as suas restrições burocráticas e seus trâmites legais e uma constante disputa de interesses de classes sociais. Entretanto é preciso apontar o horizonte polÃtico para que a polÃtica pública do Cultura Viva tenha como base as vozes e as necessidades do Movimento PolÃtico Cultura Viva, caso essa não seja a lógica o processo de degeneração é previsÃvel.Â
A PolÃtica Cultura Viva teve seus momentos de ascensão, no momento que as vozes populares orquestraram a polÃtica pública. Nos governos do campo democrático (Lula, Dima e Lula) tivemos avanços e retrocesso e nos governos de direita tivemos o desmonte das públicas para cultura no paÃs, não somente do Cultura Viva.Â
Com o novo governo Lula, a PolÃtica Nacional do Cultura Viva é retornada e impulsionada pela PolÃtica Nacional Aldir Blanc (PNAB). Essa retomada representa uma celebração para os movimentos sociais no sentido de reoxigenarem a esperança financeira para manutenção dos espaços e suas ações. A PNAB prevê a percentualização para o Cultura Viva que é resultado da compreensão polÃtica da importância do Cultura Viva para a promoção da cidadania e capilaridade social e cultural dos Pontos de Cultura com toda a sua dimensão transversal e a sua potência para diversidade e pluralidade de lugares, territórios e contextos estéticos, artÃsticos e culturais.Â
Ao mesmo tempo essa retomada se apresenta como uma ameaça para movimento, em especial para a PolÃtica Nacional do Cultura Viva. Quais as evidências? Desde que foi iniciada essa retomada, o Cultura Viva vem sendo tratado pelo Ministério da Cultura, como mais uma polÃtica pública para a cultura, sem perceber as suas peculiaridades e o seu objetivo estratégico para o paÃs e o protagonismo social, fato que se comprava pela passagem das caravanas do MinC nos diversos estados brasileiros divulgando os primeiros editais destinados ao Cultura Viva, o que se percebeu foi um apagamento do conceito polÃtico do Cultura Viva e das forças polÃticas que compõe as comissões de representações legais dos Pontos de Cultura. O Ministério passou vendendo o peixe do edital, tratando como igual o que é para ser diferente.Â
Com a primeira leva de editais da PNAB direcionados ao Cultura Viva, o Movimento PolÃtico Cultura Viva se deparar com um processo degenerativo apresentado pelo Ministério da Cultura que merece o repúdio e a defesa dos mais diversos Pontos de Cultura espalhados pelo PaÃs.Â
O norte polÃtico adotado pelo Ministério da Cultura para a polÃtica de editais do Cultura Viva está fora contexto e da realidade da PolÃtica Nacional do Cultura Viva e dos Pontos de Cultura. O seu caráter burocratizante, academicista dar a dimensão elitista e excludente destes editais. O viés direcional retira a autonomia polÃtica, organizativa e as caracterÃsticas singulares de reinvenção da realidade e das formas de organização social. Não considerar os aspectos da diversidade e a pluralidade dos Pontos de Cultura, como instrumento de redescoberta, hibridismo, transversalidade e ruptura das normas de exclusão, elitização e concentração polÃtica e econômica que marcaram a história das polÃticas públicas do paÃs antes do primeiro governo Lula (2003).Â
Já estamos na metade deste governo e o Ministério da Cultura ainda não percebeu que o Cultura Viva é o caminho para radicalidade da democracia cultural. A pedagogia de baixo para cima são os comitês populares de luta e de cultura já existentes, perto do povo e dos seus anseios. O Cultura Viva não deve ser tratado como mercadoria, não se constitui para gerar produtos como aponta os instrumentais do governo. Geramos sonhos, processos, pequenas revoluções e um imenso desejo de transformar o mundo.Â
O Movimento PolÃtico Cultura Viva precisa desempregar essa noção atrasada, excludente e elitista que vem operando no Governo Lula a PolÃtica Nacional do Cultura Viva.